Somos contra a mineração!

Alonso Mazini Soler

Escrito por Alonso Mazini Soler

30 de outubro 2017| 7 min. de leitura

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Somos contra a mineração!

Em tempos de pós-verdade, a ditadura de opiniões, geralmente demagógicas e superficiais, prevalece sobre o conhecimento aprofundado dos fatos e sobre a verdade, esta última, subjugada à sua irrelevância. Nesse contexto queremos nos manifestar de modo irônico: Somos contra a mineração!
Somos contra essa atividade invasiva da “sociedade moderna” que fere e sangra o nosso planeta com o objetivo de extrair riquezas minerais que servirão apenas ao deleite da classe dominante em detrimento dos demais subjugados. Quais as justificativas para a exploração de riquezas que levaram bilhões de anos para serem formadas em depósitos únicos e que, em muitos casos, nunca mais serão formados (pelo menos em tempos humanos)?
Nossa ação afirmativa será implacável. Lutaremos no front das redes sociais, postaremos fotos de perfis caracterizadas com desenhos de árvores coloridas, “descurtiremos” com o botão de raiva todos os posts contrários à nossas convicções e bloquearemos pseudo amigos que pensarem diferente de nós. Somos “do bem”, politicamente corretos e defendemos a natureza contra a mineração.

Contra a revolução industrial

E, por coerência, mudaremos o nosso estilo de vida. Atitude será o nosso grito de guerra. Nos libertaremos deste mal, abrindo mão de certos privilégios neoliberais, exemplos da dominação do capital. Decidimos então abolir:

  • O vaso sanitário (feldspato) e o papel higiênico (argila que o deixa branco e macio);
  • A escova de dente (plástico – derivado de petróleo) e o dentifrício com flúor (fluorita);
  • A água encanada (PVC – derivado de petróleo), o esgoto (tubos de cimento – calcário), a eletricidade (fios de cobre ou alumínio);
  • O fogão, a geladeira, as panelas, os talheres, pois tudo leva metal (basicamente, ferro e alumínio);
  • As roupas que, apesar de, muitas vezes, serem de origem vegetal, são coloridas e têm as cores fixadas por produtos minerais (barrilha);
  • Os veículos, os celulares, televisão, computadores, elevadores, o ar condicionado, o aquecedor… nossos óculos etc.
  • Em consequência, aboliremos o uso dos “apps” que nos conectam com o mundo… o facebook, o instagram, o whatsapp, etc.

… reescreveremos a história abolindo a revolução industrial.

Dependência da mineração

Oops! Como assim? Mas, tudo depende da mineração? Nossa vida, tal como está configurada atualmente, depende integralmente da mineração? Seria mesmo essa uma atividade que atende apenas aos interesses econômicos da classe dominante?
Uhmmm! É difícil pensar nisso!!!!
Desde seus primórdios a evolução da sociedade foi fundamentada na exploração mineral – desde quando o homem deixou de ser nômade e começou a caçar e arar a terra com ferramentas metálicas. Pronto, eis ali o elo perdido da atual exploração mineral considerada, atualmente, como uma atividade politicamente incorreta. Portanto, não é de hoje que a mineração alicerça o desenvolvimento e a evolução do ser humano no planeta.
Construções utilizam cimento – tijolo e estruturas metálicas são todos produtos da mineração. A medicina é totalmente dependente de bens minerais através da composição química de muitos dos remédios que nos alentam as dores, prolongam e proporcionam mais qualidade à nossa vida. É também da terra que são extraídos os corretivos de solo, pesticidas e incrementos agrícolas que servem para nos alimentar em escala mundial.

Relevância econômico-social

Ah! E vamos considerar também que o setor mineral no Brasil é de extrema relevância sob o ponto de vista econômico e social. Dados oficiais apontam para a participação da mineração com 4% do PIB e 20% das exportações da balança comercial.
Sem considerar que as mineradoras recolhem a CFEM (Compensação Financeira pela Exploração de Recursos Minerais), imposto conhecido como o “Royalty da mineração”. Trata-se de uma compensação de receita dirigida majoritariamente aos municípios em que as jazidas estão localizadas (65%). Quando bem utilizada pelas prefeituras, costuma se converter em investimentos e ganhos em prol da população local. Ou seja, geração de empregos e renda, arrecadação de tributos, dinâmica econômica.

Dependência humana da mineração

Enfim, temos que pararpor um momento para refletir seriamente sobre a dependência humana da mineração… apenas um pouquinho além da superficialidade das discussões nas redes sociais ou das opiniões manipuladoras de artistas “incorporados” como agentes de mudança social. Daí concluiremos que estamos todos, intrinsicamente, ligados a ela. E que a condenação vil, histérica e exagerada desta atividade econômica não passa de uma atitude hipócrita. Afinal, não há uma única pessoa que consiga atualmente viver/sobreviver sem depender desta ação humana.

Conclusão

Uhmm! Vamos então aparar as arestas e ajustar os termos da nossa manifestação inicial, deixando a ironia de lado. Não somos contrários à mineração. Mas devemos nos empenhar para que a pesquisa e a lavra ocorram em sintonia e em respeito com a preservação da natureza. Dentro de princípios reconhecidos de governança e ética, observando diligentemente o cumprimento da legislação vigente. Assim minimizando riscos e impactos ambientais e sociais, adotando o estado da arte da tecnologia, reduzindo os desperdícios e buscando a eficiência de todos os processos produtivos.
Queremos poder desfrutar dos benefícios da mineração sim. Mas de forma coerente com nosso desejo e luta de deixar preservado o legado da vida plena e plural às futuras gerações.
Maria Paula Delicio, Geóloga, Paleontóloga, Professora Doutora do Departamento de Engenharia Geológica e Diretora do Museu de Ciência e Técnica da Escola de Minas / UFOP – Universidade Federal de Ouro Preto – mpaula@degeo.ufop.br
Alonso Mazini Soler, Doutor em Engenharia de Produção POLI/USP e Professor da Pós Graduação do Insper – alonso.soler@schedio.com.br