Até quando vale a pena insistir na mentira de que a obra vai terminar no prazo?

Aldo Dórea Mattos

Escrito por Aldo Dórea Mattos

16 de outubro 2017| 5 min. de leitura

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Até quando vale a pena insistir na mentira de que a obra vai terminar no prazo?

Tirei a figura que ilustra este post de um interessante comentário feito no LinkedIn pelo colega Márcio Sperandio Cott, jovem engenheiro bastante ativo em divulgar boas práticas de gestão de obras.
O gráfico de avanço (%) versus tempo (semanas) mostra três curvas:

  • BL (verde) = baseline ou linha de base, corresponde ao planejamento original da obra;
  • R (vermelha) = realizado, corresponde ao avanço real da obra;
  • PR (azul) = plano de recuperação, corresponde à ação proposta pelo setor de planejamento para recuperar o atraso.

 
 Fonte: https://www.linkedin.com/feed/update/urn:li:activity:6318381016121692160  
A pergunta do autor é um murro no estômago: até quando vale a pena insistir na mentira de que a obra vai terminar no prazo?  
Em primeiro lugar, precisamos interpretar o que está acontecendo na obra do exemplo. Notamos que o planejamento revela uma curva S que condiz com o comportamento esperado:  

  • Nas primeiras semanas o avanço da obra é relativamente modesto, porque as equipes estão em fase de mobilização, conhecimento do serviço e desenvolvimento do espírito de coletividade; 
  • Em seguida, a obra entra em “velocidade de cruzeiro”, com simultaneidade de atividades e frentes de serviço, resultando num avanço firme ao longo de várias semanas intermediárias; 
  • Perto do final da obra, o avanço semanal começa a ser mais baixo porque as frentes de serviço vão chegando ao fim, começa a desmobilização e já não há equipe numerosa na obra. 

A curva vermelha revela que o avanço real ficou sempre aquém do planejado. As razões podem ter sido: 

  • Mobilização problemática, seja por falta de gente, seja por falta de área liberada; 
  • Atraso na entrega de materiais devido a problemas logísticos; 
  • Fundação da obra mais complicada do que o previsto; 
  • Dificuldade de alcançar a produtividade planejada por questões de capacitação dos operários;
  • Alto índice de retrabalho. 

Vamos parar a cena aqui. A obra está na semana 8, a “boca do jacaré” entre as curvas vermelha e verde é enorme, e chegou a hora de o planejador emitir um relatório de progresso ou de status. COMO PROCEDER? 
Eu vejo duas correntes de pensamento para se responder a essa pergunta: 

1ª Corrente – Prazo Realista

O planejador afirma que há um atraso e apresenta um cronograma compatível com o avanço ocorrido até a data. Revela a seu superior — ou a seu cliente — que aconteceram contratempos, qual o atraso real e apresenta uma lista de ações para mitigação do estouro de prazo.  

Vantagens

  • Mostra o cenário real; 
  • Apresenta um plano de recuperação plausível; 
  • Ao apontar uma tendência de atraso, o cliente para ajudar com alguma medida; 
  • Cria-se uma noção de realismo nas informações prestadas; 
  • Alerta o alto escalão e o cliente para a probabilidade de multa contratual; 

Desvantagens

  • O planejador tem que ser valente; 
  • Pode-se criar desconforto com o cliente e deterioração na relação entre as partes. 

 2ª Corrente – Prazo Otimista

O planejador constata que há um atraso e apresenta um cronograma de recuperação total desse atraso. Revela a seu superior — ou a seu cliente — que as medidas para mitigação do estouro de prazo são factíveis e que tudo será resolvido. A curva azul, segundo o colega Roberto Stonner, é a famigerada curva J!! 

Vantagens

  • Não cria um espírito de desânimo na equipe da obra; 
  • Preserva a relação com o cliente; 
  • Não expõe o planejador a broncas severas e punições na frente de todo…. 

Desvantagens

  • O planejador apresenta medidas que ele sabe que não são factíveis; 
  • O alto escalão e o cliente precisam ser muito bem convencidos de que o atraso será mesmo eliminado; 
  • Gera desconfiança com relação ao setor de planejamento; 
  • A “ficção” não conseguirá ser mantida por muito tempo. 

Conclusão

Eu já adotei ambas as vertentes. Minha experiência diz o seguinte: não se consegue alterar o rumo da obra depois de um certo tempo. Até 1/3 do cronograma, ainda se consegue botar o trilho nos eixos; depois, só a muito custo (vários turnos, etc.).  
P.S. A segunda corrente normalmente surge da ordem “não quero saber, se vire!!! Na Bahia há a variação “não quero saber, vista sua fantasia de sapo e dê seus pulos! 
E você? Já deu seus pulos?