Tirei a figura que ilustra este post de um interessante comentário feito no LinkedIn pelo colega Márcio Sperandio Cott, jovem engenheiro bastante ativo em divulgar boas práticas de gestão de obras.
O gráfico de avanço (%) versus tempo (semanas) mostra três curvas:
- BL (verde) = baseline ou linha de base, corresponde ao planejamento original da obra;
- R (vermelha) = realizado, corresponde ao avanço real da obra;
- PR (azul) = plano de recuperação, corresponde à ação proposta pelo setor de planejamento para recuperar o atraso.
Fonte: https://www.linkedin.com/feed/update/urn:li:activity:6318381016121692160
A pergunta do autor é um murro no estômago: até quando vale a pena insistir na mentira de que a obra vai terminar no prazo?
Em primeiro lugar, precisamos interpretar o que está acontecendo na obra do exemplo. Notamos que o planejamento revela uma curva S que condiz com o comportamento esperado:
- Nas primeiras semanas o avanço da obra é relativamente modesto, porque as equipes estão em fase de mobilização, conhecimento do serviço e desenvolvimento do espírito de coletividade;
- Em seguida, a obra entra em “velocidade de cruzeiro”, com simultaneidade de atividades e frentes de serviço, resultando num avanço firme ao longo de várias semanas intermediárias;
- Perto do final da obra, o avanço semanal começa a ser mais baixo porque as frentes de serviço vão chegando ao fim, começa a desmobilização e já não há equipe numerosa na obra.
A curva vermelha revela que o avanço real ficou sempre aquém do planejado. As razões podem ter sido:
- Mobilização problemática, seja por falta de gente, seja por falta de área liberada;
- Atraso na entrega de materiais devido a problemas logísticos;
- Fundação da obra mais complicada do que o previsto;
- Dificuldade de alcançar a produtividade planejada por questões de capacitação dos operários;
- Alto índice de retrabalho.
Vamos parar a cena aqui. A obra está na semana 8, a “boca do jacaré” entre as curvas vermelha e verde é enorme, e chegou a hora de o planejador emitir um relatório de progresso ou de status. COMO PROCEDER?
Eu vejo duas correntes de pensamento para se responder a essa pergunta:
1ª Corrente – Prazo Realista
O planejador afirma que há um atraso e apresenta um cronograma compatível com o avanço ocorrido até a data. Revela a seu superior — ou a seu cliente — que aconteceram contratempos, qual o atraso real e apresenta uma lista de ações para mitigação do estouro de prazo.
Vantagens
- Mostra o cenário real;
- Apresenta um plano de recuperação plausível;
- Ao apontar uma tendência de atraso, o cliente para ajudar com alguma medida;
- Cria-se uma noção de realismo nas informações prestadas;
- Alerta o alto escalão e o cliente para a probabilidade de multa contratual;
Desvantagens
- O planejador tem que ser valente;
- Pode-se criar desconforto com o cliente e deterioração na relação entre as partes.
2ª Corrente – Prazo Otimista
O planejador constata que há um atraso e apresenta um cronograma de recuperação total desse atraso. Revela a seu superior — ou a seu cliente — que as medidas para mitigação do estouro de prazo são factíveis e que tudo será resolvido. A curva azul, segundo o colega Roberto Stonner, é a famigerada curva J!!
Vantagens
- Não cria um espírito de desânimo na equipe da obra;
- Preserva a relação com o cliente;
- Não expõe o planejador a broncas severas e punições na frente de todo….
Desvantagens
- O planejador apresenta medidas que ele sabe que não são factíveis;
- O alto escalão e o cliente precisam ser muito bem convencidos de que o atraso será mesmo eliminado;
- Gera desconfiança com relação ao setor de planejamento;
- A “ficção” não conseguirá ser mantida por muito tempo.
Conclusão
Eu já adotei ambas as vertentes. Minha experiência diz o seguinte: não se consegue alterar o rumo da obra depois de um certo tempo. Até 1/3 do cronograma, ainda se consegue botar o trilho nos eixos; depois, só a muito custo (vários turnos, etc.).
P.S. A segunda corrente normalmente surge da ordem “não quero saber, se vire”!!! Na Bahia há a variação “não quero saber, vista sua fantasia de sapo e dê seus pulos”!
E você? Já deu seus pulos?