No mês de julho de 2023, a FGV-SP (Fundação Getúlio Vargas de São Paulo) revisou sua metodologia de cálculo e implementou amplas mudanças no INCC (Índice Nacional da Construção Civil). Desde a última revisão, em 2009, a indústria da construção e o mercado imobiliário passaram por mudanças estruturais importantes, que não vinham sendo refletidas pelo indicador.
Com a crescente diversificação da contratação de mão de obra, introdução de novas tecnologias e mudanças na composição do mercado imobiliário, tornou-se necessário atualizar a forma de calcular o INCC. O mercado imobiliário recebeu bem a novidade, e acredita que o indicador estará mais aderente à realidade dos custos praticados nas obras e proporcionará maior segurança jurídica e previsibilidade na contratação de serviços.
Este artigo se propõe a detalhar essas alterações metodológicas recentes, permitindo que profissionais do mercado imobiliário compreendam e se adaptem a esta nova abordagem. Acompanhe este mergulho nas novidades do índice e entenda como ele se alinha agora ao cenário setorial em constante evolução.
O que é o INCC da FGV?
O INCC (Índice Nacional da Construção Civil) calculado pela FGV-SP (Fundação Getúlio Vargas de São Paulo) é uma ferramenta essencial que reflete as variações de custo na construção civil brasileira. Sua relevância se estende além da simples quantificação dos preços, sendo uma peça-chave para ajustes contratuais, planejamento de obras e tomadas de decisão estratégica no setor imobiliário. Este índice serve como um termômetro para as construtoras, investidores e profissionais, permitindo-lhes uma visão clara das tendências de custo e ajudando a prever possíveis cenários econômicos.
Historicamente, o INCC tem sido atualizado para acompanhar as mudanças dinâmicas no setor de construção. Desde sua concepção, o índice passou por diversas revisões metodológicas. Cada uma dessas atualizações foi planejada para tornar o índice mais alinhado à realidade da indústria, considerando variáveis como inovações tecnológicas, mudanças regulatórias e alterações no cenário econômico nacional. Em 2009, por exemplo, o lançamento do programa “Minha Casa Minha Vida” trouxe novos desafios e nuances ao setor, influenciando diretamente os componentes do INCC. A mudança no INCC e sua revisão de cálculo não são apenas reações a tais mudanças, mas também uma tentativa proativa de antecipar e incorporar transformações futuras no setor.
Por que as mudanças no INCC eram necessárias?
Nos últimos 14 anos, o Brasil experimentou significativas flutuações em seu cenário macroeconômico, impactando diversos setores, incluindo o da construção civil. A economia do país navegou por períodos de crescimento acelerado, recessão e subsequente recuperação. No contexto da construção civil, um dos setores mais sensíveis a tais mudanças, ocorreram transformações estratégicas, como veremos a seguir.
Maior representatividade da habitação econômica
O mercado imobiliário brasileiro viveu um marco em 2009 com a introdução do programa “Minha Casa Minha Vida”. Concebido como uma resposta às demandas habitacionais do país, o programa catapultou o segmento de habitação social para o centro do palco imobiliário.
Em poucos anos, este segmento ganhou uma importância sem precedentes, alterando significativamente o perfil de investimentos e construções no setor. Diante de tamanha relevância da habitação social, tornou-se imperativo que as métricas usadas para acompanhar os custos no setor, como o INCC, refletissem adequadamente essas mudanças.
Inovações tecnológicas e normativas na construção
A forma como se constrói no Brasil também mudou nestes anos. Novos sistemas construtivos ganharam popularidade, como os métodos de construção a seco, os sistemas de paredes de concreto e os kits hidráulicos, evidenciando uma busca incessante por eficiência, redução de custos e agilidade nas obras.
Foi neste período, também, que a Norma de Desempenho (NBR 15.575:2013 – Edificações Habitacionais – Desempenho) entrou em vigor, estabelecendo requisitos claros de qualidade e segurança para construções de diversos padrões.
Assim, essas transformações também se veem refletidas na recente mudança do INCC, assegurando que o índice continue refletindo fielmente o panorama atual do mercado construtivo brasileiro.
Novas formas de contratação de mão de obra
A dinâmica da mão de obra no setor da construção civil experimentou uma importante transformação na última década. Antes caracterizado por um alto contingente de mão de obra própria das construtoras, o setor tem agora priorizado a contratação de prestadores de serviços terceirizados.
Esta mudança foi impulsionada pela busca de expertise e pela necessidade de flexibilização nas operações construtivas. Para se ter uma ideia, as empresas que ofereciam esses serviços especializados contribuíam com aproximadamente 17% do PIB em 2009; hoje, esse valor saltou para 28% do PIB, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas) que embasaram o trabalho da FGV/SP nesta mudança no INCC.
Quais os principais pontos das mudanças no INCC?
A revisão na metodologia pode ser entendida sob três óticas principais: a estrutura de custos das construtoras, os padrões construtivos e a participação dos municípios pesquisados no total nacional. Com isso, estabeleceu-se uma nova configuração de pesos, mais adequados à realidade atual do mercado, que permitirão aferir custos de construção (e sua evolução no tempo) de maneira mais aderente ao que se realiza nos canteiros.
Estrutura de custos
Após uma análise dos orçamentos analíticos cedidos por construtoras de expressão nacional e relativos a empreendimentos realizados entre 2018 e 2022, houve uma revisão da estrutura de aferição dos custos de materiais e mão de obra. Assim, houve um aumento de 52 para 79 subitens totais, sendo que os subitens que representam as categorias mais relevantes de mão de obra saltaram de 11 para 19.
Correspondência entre os subitens do INCC Atual e do INCC Novo
Código | Descrição | INCC (Atual) | INCC (Novo) | Diferença |
101 | Vergalhões e arames de aço ao carbono | 3,02% | 6,50% | 3,48% |
102 | Aduela e alizar de madeira | 0,50% | 0,31% | -0,19% |
103 | Aluguel de máquinas e equipamentos | 1,86% | 1,53% | -0,33% |
104 | Areia lavada | 0,23% | 0,43% | 0,20% |
106 | Placas cerâmicas para revestimento | 0,66% | 1,50% | 0,84% |
109 | Carreto para retirada de entulho | 0,28% | 0,24% | -0,04% |
111 | Cimento Portland comum | 2,42% | 2,10% | -0,32% |
114 | Pias, cubas e louças sanitárias | 0,72% | 0,75% | 0,03% |
115 | Eletrodutos de pvc | 0,30% | 0,80% | 0,50% |
116 | Elevador | 3,51% | 3,88% | 0,37% |
119 | Condutores elétricos | 0,92% | 1,32% | 0,40% |
121 | Gesso | 0,38% | 0,30% | -0,08% |
122 | Impermeabilizante | 0,71% | 1,48% | 0,77% |
123 | Esquadrias de alumínio | 1,85% | 2,78% | 0,93% |
124 | Ladrilhos e placas para pisos | 0,21% | 0,46% | 0,25% |
128 | Madeira para telhados | 1,11% | 0,37% | -0,74% |
129 | Mármore e granito trabalhados | 0,42% | 0,60% | 0,18% |
131 | Materiais elétricos | 0,92% | 2,07% | 1,15% |
132 | Metais para instalações hidráulicas | 2,02% | 0,71% | -1,31% |
133 | Pedra britada | 0,24% | 0,16% | -0,08% |
136 | Portas e janelas de madeira | 0,65% | 0,88% | 0,23% |
141 | Projetos | 3,04% | 3,39% | 0,35% |
151 | Tinta a óleo | 0,34% | 0,27% | -0,07% |
152 | Tinta à base de pva | 0,72% | 0,27% | -0,45% |
153 | Tubos e conexões de ferro e aço | 1,63% | 0,20% | -1,43% |
154 | Tubos e conexões de PVC | 1,80% | 2,36% | 0,56% |
160 | Massa corrida para parede – PVA | 0,38% | 0,74% | 0,36% |
162 | Argamassa | 1,93% | 0,84% | -1,09% |
163 | Massa de concreto | 2,27% | 4,45% | 2,18% |
203 | Armador ou ferreiro | 1,65% | 3,04% | 1,39% |
204 | Bombeiro | 3,14% | 3,07% | -0,07% |
205 | Carpinteiro (fôrma, esquadria e telhado) | 5,68% | 2,98% | -2,70% |
206 | Eletricista | 3,15% | 3,43% | 0,28% |
207 | Encarregado | 2,62% | 2,50% | -0,12% |
208 | Engenheiro | 4,15% | 3,06% | -1,09% |
210 | Gesseiro | 1,69% | 0,87% | -0,82% |
213 | Pedreiro | 6,07% | 7,90% | 1,83% |
214 | Pintor | 1,78% | 2,53% | 0,75% |
215 | Servente | 9,73% | 2,00% | -7,73% |
Fonte: FGV-SP
Padrões construtivos
A estrutura de ponderação do INCC foi revisada para incluir mais subitens, refletindo a modernização dos processos construtivos residenciais. A análise orçamentária por padrão construtivo mostrou que materiais e equipamentos têm pesos diferentes em construções populares, de padrão médio e de alto padrão.
Peso dos padrões construtivos definidos para o INCC
Padrões | Pesos |
Econômico (Eco) | 33% |
Médio (Med) | 41% |
Alto (Alt) | 26% |
Fonte: FGV-SP
Pesos das cidades participantes
O número de cidades pesquisadas pela FGV-SP não mudará após a mudança no INCC. Os preços continuarão sendo aferidos em sete municípios brasileiros. O que muda é o peso de cada município no cômputo final do índice, considerando a relevância do setor da construção de cada município em comparação com seu Estado. Veja a seguir as principais mudanças.
Peso das cidades componentes do INCC
Cidades | INCC Atual | INCC Novo |
Recife | 5,24 | 3,81 |
Salvador | 9,31 | 7,84 |
Belo Horizonte | 11,13 | 16,16 |
Rio de Janeiro | 9,49 | 14,27 |
São Paulo | 43,29 | 44,51 |
Porto Alegre | 11,04 | 10,54 |
Brasília | 10,5 | 2,87 |
Brasil | 100 | 100 |
Fonte: FGV-SP
Dúvidas frequentes sobre as mudanças no INCC
Veja algumas questões sobre a recente revisão do indicador da FGV.
Com a revisão do INCC, os preços dos suprimentos vão cair?
Não. O INCC é um índice de preços fruto de uma pesquisa de campo sobre os valores praticados no mercado. Dessa forma, ele reflete a variação dos preços que já ocorre por motivos diversos ligados à oferta e à demanda de produtos e serviços. Ele não determina o aumento ou a diminuição dos preços de materiais.
No entanto, ele pode ser usado como índice de reajuste de contratos diversos, incluindo de preços de serviços especializados. Nesse caso, ele pode ter influência pontual nos custos das obras.
Qual a diferença entre o INCC-M, o INCC-10 e o INCC-DI?
Segundo a FGV-SP, que calcula o índice, as apurações são mensais e estão disponíveis nas versões 10, M e DI. A diferença entre elas é apenas o período de coleta, que ocorre sempre ao longo de 30 dias, mas com intervalos de 10 dias entre uma e outra. O índice padrão, no entanto, é o INCC-M. É dele que falamos quando ocultamos o sufixo “M”.
Qual foi a variação do INCC em julho de 2023?
Segundo a FGV-SP, a variação do INCC-M em julho de 2023 foi de 0,06% e já considera a nova metodologia.
Qual a variação acumulada do INCC em 12 meses em julho de 2023?
Essas foram as variações mensais e acumuladas do INCC nos últimos meses.
INCC 2023 – Tabela de variações mensais
Mês de referência | Evolução Mensal | Acumulado 12 meses |
jul/23 | 0,06% | 3,15% |
jun/23 | 0,85% | 4,29% |
mai/23 | 0,40% | 6,32% |
abr/23 | 0,23% | 7,48% |
mar/23 | 0,18% | 8,17% |
fev/23 | 0,21% | 8,76% |
jan/23 | 0,32% | 9,05% |
dez/22 | 0,27% | 9,40% |
nov/22 | 0,14% | 9,44% |
out/22 | 0,04% | 10,06% |
set/22 | 0,10% | 10,89% |
ago/22 | 0,33% | 11,40% |
jul/22 | 1,16% | 11,66% |
Fonte: FGV-SP
Conclusão
A revisão metodológica do INCC realizada em julho de 2023 pela FGV-SP surge como resposta a um setor da construção civil que se mostra em contínua evolução. Esta atualização reconhece e incorpora as significativas mudanças observadas no setor imobiliário e na indústria da construção desde a última revisão, em 2009.
Fatores como a crescente terceirização da mão de obra, inovações tecnológicas e a evolução no cenário macroeconômico brasileiro evidenciam a necessidade da mudança no INCC. A nova abordagem – com um novo sistema de pesos para a estrutura de custos, padrões construtivos e a ponderação das cidades pesquisadas – visa trazer uma maior precisão ao índice, refletindo de maneira mais fiel os custos atuais das construções.
Em última análise, as mudanças no INCC tendem a melhorar a aderência entre as variações do índice e os preços praticados na realidade do mercado. Isso deve proporcionar maior segurança jurídica aos contratos do setor, sobretudo os de prestação de serviços indexados pelo indicador da FGV.