- A Reforma Tributária na Construção Civil exige uma mudança cultural nas empresas, impactando VGV, fornecedores, precificação, contratos, estrutura organizacional e cultura empresarial.
- A adaptação à Reforma não pode ser delegada apenas à contabilidade, envolvendo os líderes do setor em uma revisão profunda de práticas e modelos de gestão.
- A Reforma Tributária atinge o coração das decisões empresariais, exigindo uma análise mais profunda de custos, fornecedores, contratos e margens, além de uma reorganização da cadeia produtiva.
A Reforma Tributária representa uma virada estrutural no modelo de negócio para construtoras e incorporadoras. Mais do que alterar tributos e alíquotas, ela impõe uma mudança de mentalidade que atinge a forma de gerir empresas, planejar empreendimentos e conduzir negociações. O que antes se resolvia com cálculos contábeis, agora exige decisões estratégicas que atravessam toda a operação.
VGV, fornecedores, precificação, contratos, estrutura organizacional e até a cultura empresarial passam a ser impactados de maneira direta. Durante o Construsummit 2025, Keila Hoog, diretora executiva da Axia BPO, e Caio Melo, consultor e palestrante, reforçaram que a adaptação não pode ser delegada apenas à contabilidade.
Ela precisa envolver os líderes do setor em uma revisão profunda de práticas e modelos de gestão. Para quem conduz negócios na Construção Civil, entender como a Reforma Tributária afeta as empresas é o primeiro passo para construir uma estratégia de Reforma Tributária capaz de sustentar a competitividade no longo prazo.
Vamos saber mais sobre isso neste artigo.
Por que a Reforma Tributária exige uma mudança cultural nas empresas
A Reforma não deve ser entendida como uma simples revisão de impostos. Ela abre espaço para uma transformação estrutural, exigindo das empresas uma nova mentalidade em gestão, cultura e estratégia de negócios.
Não é só sobre tributo: é sobre modelo de negócio
Keila Hoog, diretora executiva da Axia BPO, foi direta ao afirmar que a Reforma Tributária “é uma reforma da cultura na Construção Civil”. Segundo ela, o modelo atual — em que o empreendedor calcula VGV, custos e aplica a alíquota de 4% do RET — não se sustenta mais. Agora, é necessário avaliar custos em profundidade, analisar fornecedores, entender como cada parceiro recolhe tributos e como isso impacta o fluxo da obra.
Caio Meio, consultor e palestrante, reforçou esse ponto ao dizer que o nome “Reforma Tributária” pode até ser tecnicamente correto, mas não traduz a realidade: “é uma reforma de modelo de negócio, de precificação, de contratação de fornecedores, de contratos de longo prazo, que por acaso mexe nos tributos”. Para ele, o impacto ultrapassa a esfera fiscal e redefine a lógica de operação das empresas.
O fim da informalidade como prática comum no setor
Outro aspecto destacado por Keila é o fim da informalidade como prática recorrente na Construção Civil. A nova lógica de créditos e débitos exige registros consistentes e relações comerciais mais transparentes. “Essa informalidade tende a acabar muito em breve”, afirmou.
A mudança traz também um novo nível de complexidade para o setor. O que antes se resolvia com margens pré-definidas agora demanda estudos detalhados sobre regime tributário dos fornecedores, prazos de aproveitamento de créditos e impactos nos contratos de longo prazo. Isso coloca pressão sobre empresas que ainda mantêm práticas pouco estruturadas.
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Cultura vem do topo: o papel do CEO como guardião da transformação
Quando questionados sobre onde a mudança cultural deve começar, Keila foi enfática: “é na cabeça do empreendedor. Se não vier dele, não acontece”. Para ela, o CEO precisa assumir a posição de guardião da transformação, trazendo o tema para a rotina e engajando as equipes.
Caio complementou lembrando que a base da empresa não tem força para pressionar para cima em mudanças tão estruturais. Se a liderança não conduzir o processo, o risco é de criar um abismo entre o discurso e a prática, com regras no papel que não se refletem no dia a dia.
“O CEO sempre vai ser o guardião da cultura, referência. Pensando a cultura de verdade, não aquela que está na placa na parede, mas no comportamento cotidiano”, afirmou.
O impacto da Reforma Tributária em decisões estratégicas
As mudanças trazidas pela Reforma alcançam o coração das decisões empresariais. O que antes era tratado de forma contábil agora influencia diretamente a escolha de fornecedores, a redação de contratos e a definição das margens de cada projeto.
Mudança de lógica: do VGV para análise de custos e fornecedores
A lógica de operação das incorporadoras passa por uma virada. Como explicou Keila, o olhar que antes se concentrava no VGV e em uma margem pré-estabelecida agora precisa considerar variáveis mais complexas. “Eu tenho que olhar o meu custo, eu tenho que olhar o meu fornecedor, eu tenho que saber como ele vai prestar esse serviço, como vai cobrar de mim e como vai pagar o tributo dele.”
Caio reforçou que a simplificação prometida pela Reforma pode até funcionar em outros setores, mas na Construção Civil a realidade é diferente: “para construtoras, incorporadoras e loteadoras, ficou mais complexo. É uma mudança de forma de comprar, de selecionar fornecedor. Não basta só olhar o preço”.
Como fornecedores, contratos e margens serão impactados
O impacto não se limita ao processo de compras. Ele alcança contratos de longo prazo e a própria margem dos empreendimentos. Caio explicou que será preciso calcular se o crédito gerado por determinado fornecedor realmente compensa no fluxo da obra.
Além disso, os contratos atuais raramente preveem cláusulas de repactuação tributária, o que pode gerar disputas.
“Hoje, você vende por R$ 1.000 e paga seus impostos dentro desse valor. Com a Reforma, os tributos passam a ser por fora. O contrato não prevê isso. Na hora da negociação, é ‘farinha pouca, meu pirão primeiro’”, alertou.
O comercial, portanto, terá um papel estratégico ao explicar as novas condições para o cliente final e sustentar a competitividade no mercado.
Pressão sobre parceiros menores e a reorganização da cadeia
A reorganização da cadeia produtiva também será inevitável. Caio apontou que os maiores players do setor já pressionam os fornecedores menores a se adequarem, sob risco de perderem relevância.
“Eu tenho um fornecedor que é muito relevante para a minha cadeia, mas eu também sou muito relevante para o faturamento dele. Eu preciso falar com ele: ‘Amigo, quando virar, você vai ser regime geral para dar crédito para mim? Vai continuar no Simples?’. Tudo isso vai variar.”
Esse movimento cria um efeito cascata: empresas mais organizadas exigirão regularização e transparência dos seus parceiros, acelerando a eliminação de práticas informais e fortalecendo a competitividade de quem se prepara antes.
Prazos da Reforma Tributária que demandam ação imediata
A Reforma Tributária já está em andamento, e o calendário de implementação impõe decisões estratégicas a curto e médio prazo. Ignorar essas datas pode comprometer resultados futuros, especialmente em um setor marcado por projetos de longa maturação.
2025: início da organização e estudo
Segundo Caio Melo, nenhum empresário pode chegar a 2026 sem ter iniciado a análise de impacto da Reforma. O ano de 2025 deve ser usado para estruturar diagnósticos internos, revisar processos e envolver fornecedores. É também o momento de acionar contadores e consultores especializados, garantindo clareza sobre os próximos passos.
2026 a 2027: impacto nos balanços e redutor de ajuste
A virada de 2026 para 2027 traz uma oportunidade estratégica: os imóveis que estiverem registrados nesse período poderão ser beneficiados pelo redutor de ajuste. Caio explicou: “Se eu tenho um imóvel que custou 100 mil, mas que hoje vale 1 milhão, eu vou poder considerar o valor de mercado. Isso gera uma diferença enorme”. O impacto nos balanços será direto e exige planejamento desde já para aproveitar esse benefício fiscal.
2028: Última janela para aderir ao RET com 4%
Para quem atua em incorporação, o prazo de dezembro de 2028 é decisivo. Projetos aprovados e incorporados até essa data poderão continuar no regime de 4% até a última unidade ser vendida. Keila destacou que muitas empresas já aceleram a compra de terrenos e a aprovação de projetos para garantir essa vantagem.
Ela completou: “Não quer dizer que eu vou começar a construir tudo de uma vez. Mas, via de regra, tudo que está aprovado, incorporado até dezembro de 28 e aderido ao RET, com patrimônio de afetação, eu vou poder continuar tributando no 4% até a última venda da última unidade.”
O papel da tecnologia na adaptação à nova realidade
A Reforma Tributária exige que construtoras e incorporadoras abandonem a lógica de processos isolados. A nova realidade de créditos e débitos, somada ao impacto direto em contratos e margens, só pode ser gerida com o apoio de tecnologia. Sistemas de gestão passam fundamentais para a adaptação, permitindo transformar a contabilidade de uma simples obrigação fiscal em uma ferramenta de inteligência estratégica.
Keila lembrou no Construsummit 2025 que as melhores empresas já usam a contabilidade dessa forma: “é uma área muito interessante, em que a contabilidade, ela consegue ser muito ferramenta de gestão. Os melhores empresários percebem isso.”
Um ERP bem implementado pode integrar finanças, compras, comercial e jurídico, fornecendo informações em tempo real sobre custos, créditos tributários, margens e prazos. Esse nível de controle será essencial para navegar no ambiente regulatório que se aproxima.
Um exemplo claro está na área de compras. Hoje, muitas construtoras ainda selecionam fornecedores priorizando apenas o menor preço. Com a reforma, esse critério deixa de ser suficiente. Será preciso avaliar se o fornecedor gera crédito, se esse crédito é aproveitável durante a execução da obra e se o impacto compensa no fluxo de caixa.
Como destacou Keila, o setor precisará ter a mesma sofisticação de análise que já é comum em segmentos como o varejo, onde cada escolha influencia diretamente a competitividade.
A contabilidade também precisa mudar de posição dentro das empresas. Como alertou Caio, não será possível delegar decisões estruturais apenas ao contador: ele deve estar integrado à estratégia do negócio, apoiando a liderança em decisões que envolvem VGV, margens e contratos. Essa integração só é viável com tecnologia que permita cruzar dados e gerar insights acionáveis.
Dessa forma, vemos que adaptar-se à reforma significa adotar sistemas de gestão como aliados estratégicos, revisar processos internos e transformar a contabilidade em inteligência de negócio. Sem isso, a complexidade da nova tributação pode paralisar decisões e comprometer a competitividade.

A pior estratégia é o negacionismo
Entre todas as respostas à Reforma Tributária, o negacionismo é a mais arriscada. Fingir que as mudanças podem ser adiadas ou até descartadas custa caro e pode comprometer a sobrevivência de empresas no médio prazo. Como afirmou Caio Melo: “não é que vai acontecer, já aconteceu. Esse barco já saiu, já está voando, já está tudo pronto.”
A tentação de “esperar para ver” é comum diante de mudanças complexas, mas, no caso da Construção Civil, é um erro bem grande. Os ciclos longos dos empreendimentos significam que a falta de preparo hoje pode gerar problemas intransponíveis nos próximos anos, seja na precificação, nos contratos ou na relação com fornecedores.
Keila alertou que esse congelamento diante do novo é parecido com ignorar multas de trânsito: “a conta chega, e chega mais alta”.
Por outro lado, a Reforma também abre espaço para oportunidades. Empresas que iniciarem sua adaptação de forma ágil e consistente poderão ocupar territórios deixados por concorrentes mais lentos.
Como reforçou Caio: “a Reforma Tributária vai ser um divisor de águas na Construção Civil. Quem se adaptar antes e melhor, vai ocupar espaço, vai prosperar, vai crescer. Mas a gente vai ver incorporadores e construtoras pequenas se tornarem grandes, grandes se tornarem maiores ainda, e o contrário também vai acontecer.”
O recado é claro: a pior estratégia é negar a urgência da transformação. A melhor é encarar a Reforma como um ponto de virada para modernizar processos, reforçar a cultura empresarial e ganhar vantagem competitiva em um setor que, inevitavelmente, passará por uma reorganização profunda. Pense nisso!
